O relatório atualizado do ICCT demonstra a clara vantagem ambiental dos veículos elétricos ao longo de todo o seu ciclo de vida. O documento reforça urgência da transição energética e alerta para falsas equivalências metodológicas.
Neste artigo:
Necessidade climática
A eletrificação do setor automóvel europeu não é apenas uma tendência — é uma necessidade climática. A mais recente análise do International Council on Clean Transportation (ICCT), publicada esta segunda-feira, confirma o que muitos especialistas já vinham antecipando: os carros elétricos a bateria (BEVs) emitem, ao longo da sua vida útil, até quatro vezes menos dióxido de carbono equivalente (CO₂e) do que os seus congéneres movidos a gasolina.
O relatório intitulado Life-cycle greenhouse gas emissions from passenger cars in the European Union: A 2025 update and key factors to consider, assinado por Marta Negri e Georg Bieker, traça uma comparação detalhada entre várias tecnologias de motorização — desde os veículos a combustão interna (gasolina, gasóleo e gás natural), híbridos e híbridos plug-in, até às soluções totalmente elétricas, incluindo também os veículos com célula de combustível a hidrogénio.
Diferença esmagadora nas emissões ao longo do ciclo de vida
“Os nossos cálculos indicam que um BEV médio vendido na União Europeia em 2025 emite cerca de 63 g de CO₂e por quilómetro, face aos 235 g emitidos por um automóvel a gasolina convencional,” refere o relatório. “Isto representa uma redução de 73% nas emissões de gases com efeito de estufa ao longo do ciclo de vida do veículo.”
“Os carros elétricos na Europa estão a tornar-se mais limpos mais depressa do que esperávamos e ultrapassam claramente todas as outras tecnologias, incluindo os híbridos,” afirma Marta Negri, investigadora do ICCT e coautora do relatório. “Esse progresso deve-se sobretudo à rápida expansão da eletricidade renovável no continente e à maior eficiência energética dos veículos elétricos.”
Mais emissões na produção compensadas na utilização
E o cenário pode melhorar ainda mais: se o fornecimento energético for exclusivamente de fontes renováveis, o valor desce para 52 g de CO₂e/km — uma redução de 78% face ao automóvel a gasolina.
Ainda que o processo de fabrico dos BEVs — particularmente no que toca à produção de baterias — resulte inicialmente em mais emissões (cerca de 40% superiores às dos veículos convencionais), esse diferencial é compensado em menos de 17.000 quilómetros, o que equivale a um ou dois anos de uso médio.
Híbridos e gás natural: vantagens modestas
Os veículos híbridos convencionais e os plug-in registam reduções de 20% e 30%, respetivamente, quando comparados com modelos a gasolina. Já os veículos movidos a gás natural pouco diferem: a vantagem ronda apenas os 13%. “Os ganhos ambientais destes modelos são insuficientes para que cumpram os objetivos climáticos da UE,” alertam os investigadores.
Quanto aos modelos a gasóleo, a expectativa de um melhor desempenho ambiental não se confirma: as emissões ao longo do ciclo de vida são muito semelhantes às dos modelos a gasolina.
Hidrogénio com reservas e e-fuels no fio da navalha
No caso dos veículos com células de combustível (FCEVs), o ICCT apenas reconhece vantagem ambiental quando alimentados com hidrogénio produzido a partir de fontes renováveis. Mesmo assim, o documento é cauteloso: “A viabilidade a largo prazo destes modelos depende da disponibilidade de hidrogénio verde, que atualmente é escassa e dispendiosa.”
Já os combustíveis sintéticos, os chamados e-fuels, continuam envoltos em incerteza. “Poderão teoricamente alcançar níveis semelhantes de emissões aos dos BEVs, mas a sua utilização generalizada no setor rodoviário é altamente improvável, dados os custos e limitações de produção,” sublinha o relatório.
Implicações para as políticas públicas
O ICCT recomenda que a eliminação progressiva da venda de veículos com motor a combustão, incluindo híbridos e plug-in, até 2035, seja mantida ou antecipada. Para além disso, aponta para a necessidade de políticas complementares que garantam a descarbonização da produção automóvel, como critérios ambientais nos subsídios à compra e limites à pegada de carbono das baterias, já previstos na futura regulamentação europeia.
Subscreva a Newsletter
“Limitar as metas de emissões apenas aos gases de escape é uma visão incompleta. Só através de uma abordagem ao ciclo de vida completo será possível atingir a neutralidade carbónica no transporte rodoviário,” defendem os autores.
Metodologia: o detalhe que muda tudo
O estudo chama ainda a atenção para as armadilhas metodológicas que, quando mal aplicadas, podem distorcer os resultados e favorecer tecnologias menos eficazes a longo prazo. Entre os fatores críticos estão a evolução do mix energético europeu, os padrões reais de consumo e a duração média de vida útil dos veículos.
Por isso, o ICCT apela à harmonização das metodologias de Avaliação do Ciclo de Vida (LCA) no contexto das políticas públicas, para garantir comparações justas e eficazes.